sexta-feira, 18 de março de 2011

Van Gogh e o Vestido Vermelho; Parte4

O chofer para em um cruzamento cabalístico, sua vida, até então, resumira-se na simplicidade de acordar e seguir, todos os dias, sem perguntas e rugas. Porém, na pequena foto do painel repousava o destino... Aquela desproporcional onda que, de repente sem único aviso, arrebata arremessa fere transforma, simples como o gatilho, o gatilho de fagulha do tempo.
Na foto, uma mulher, a sua, vestindo o mais brilhante e perfeito vestido, um vermelho de paixão e desejo, sorri de um passado longínquo e belo. A mulher, sua, hoje e não se sabe como, espera por um filho do incrédulo e estupefato chofer! Milagre? Quem acreditaria.
Fora dado assim, breve e surreal, no princípio da manhã; Amor... Preciso dizer algo, só não sei como... Sabe aquelas coisas com anjos e mágica e impossível e poesia... Bem, eu lhe amo e sempre o amarei... Estou grávida.
Um ponto, um negro e terminante ponto. Um ponto que mudaria tudo, todos, o existir e a dúvida... Fé ou ironia?
A mulher, aquele anjo por quem pulsa seu coração, sofre de um grande mal, incurável e mortal, tão terrível que, consumindo sua lânguida vida, tirou-lhe praticamente tudo; a vontade, o brilho de estrela, os suspiros e as pequenas palavras de bondade... e, unindo-se a tudo isto, os dois ovários...
Mas agora falamos de milagre! Aleluia, Graças, Bem-Aventurança... dúvidas que nos fazem tremer. Poderia a mulher conceber do nada? Ou teria sido o amor, infinito e conquistador, a causa de tudo... a origem deste óvulo mágico, divino.
O chofer chora mudo enquanto põe o veículo novamente em trânsito, será tudo verdade meu Deus?! Um filho, uma filha... Mas então... por acaso... ela estaria completamente curada? A morte, o indefectível gélido sopro de fim, não mais emboscaria sua vida. Mas, e se ela morrer? Como poderá ele cuidar de uma mísera e frágil vida? Sem ela? Sem aquele maravilhoso vestido vermelho?
Por Deus! Poderia o Céu conceber tamanha atrocidade? Como ela, sua vida, seria condenada com tamanha penitência? Por ventura nunca mais sua vista daria com aquele magistral vestido? A marca de tudo o que um dia ele, o homem fraco e defeituoso, quis, desejou, cobiçou, fez-se escravo! De livre e espontânea vontade!
Pagaria agora a pena mais árdua e cruel?
De repente as estrelas pararam, o mundo se curvou e as horas, sorridentes a cantar, suspiraram no limite da realidade. O chofer reconheceu, o que sabia desde há muito. A grande verdade que repousa silenciosa e cansada no canto do luxuoso veículo. “TODO O ANJO QUE TANGER NAS SUTILEZAS DO DESEJO, SEJA PELO SONHO OU PELA TERRÍVEL COR, CONHECERÁ DA INEVITÁVEL RUDEZA DO CHÃO!”
O que seria, meu Deus, ter um filho portentoso de um anjo condenado? Um anjo coroado de vermelho...




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